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Naughty Dog e a estratégia Live Service da PlayStation


Com o início da geração do PlayStation 5, a Sony oficializou sua estratégia de lançar vários jogos Live Service, os famosos GaaS. Durante a consolidação da indústria nos últimos anos, a empresa fez várias aquisições voltadas aos projetos que visam aumentar a margem de lucro e o fluxo de caixa da empresa. A marca optou por colocar até mesmo os seus consagrados estúdios, especializados em single-player, dentro dos planos, escolha que naquela época já me acendia um enorme sinal de alerta.


Nos últimos anos, várias empresas tiveram problemas com o modelo, inclusive a Bungie, adquirida pela Sony para oferecer o seu know-how em Live Service aos outros estúdios, afinal Destiny permanece sendo um grande sucesso, certo? Nem tanto. Recentemente eles realizaram um corte enorme de funcionários, o que mostrou que o sucesso da IP não é tão sólido assim e que até o seu novo projeto, Marathon, seria impactado. Outros exemplos como Avengers, Redfall, Fallout 76 e Babylon’s Fall apareceram na indústria para mostrar que esse modelo não é tão simples quanto se pensava.


Com o exagero na estratégia, parte da comunidade da PlayStation sofre com a escassez de grandes jogos single-player dos principais estúdios. Já são mais de três anos sem um bom showcase que traga anúncios relevantes e a sensação, para parte do público, beira o abandono. Se tornou comum sabermos quais jogos da marca iríamos jogar nos anos seguintes. Não nessa geração. De jogos single-player first-party, a PlayStation só tem Wolverine anunciado, jogo que, por conta do ataque sofrido pela Insomniac Games, sabemos que deve ser lançado em 2026. É verdade que existem parcerias interessantes como Final Fantasy XVI, Final Fantasy VII Rebirth e Death Stranding 2, chamado de first-party pela empresa, e outras exclusividades menores. Elas são essenciais e ajudam bastante a tapar o buraco de períodos em que os estúdios first-party não conseguem entregar jogos. É normal, porém essas parcerias não são suficientes.


A falta de investimento em estúdios single-player durante a consolidação, unida à estratégia Live Service, criou um buraco que agora começa a incomodar. Vale lembrar que a Sony ainda fechou estúdios como Japan Studio e PixelOpus. Nas aquisições, garantiu apenas dois estúdios desse modelo durante a investida dos últimos anos, Housemarque e Bluepoint. A curiosidade é que esses dois estúdios já trabalhavam em exclusividade com a Sony. São ótimas aquisições, mas que não mudam em quase nada a cadência de lançamentos e composição de catálogo.


Eu poderia escrever muito aqui citando números de relatórios que justifiquem ações da empresa, mas a grande verdade é que nós sabemos muito pouco do que se passa lá dentro. A minha honesta opinião é que a Sony escolheu um caminho teoricamente mais fácil, que eu considero covarde. Abriu mão demais do que fez a marca se tornar o que é nesses quase trinta anos e agora sentiu que não é tão simples e que foi agressiva demais. Se desde o início tivessem colocado apenas novos estúdios para essa estratégia, eu não tenho dúvidas de que seria bastante viável encontrar a sua galinha dos ovos de ouro sem prejudicar o desenvolvimento de seus agora chamados “AAAA” blockbusters.


Ao mexer nos estúdios internos, que passaram as últimas décadas se especializando em jogos single-player, a empresa acabou impactando sua principal frente. Impactou aquilo que fazem de melhor. Nesse momento você leitor fecha os olhos e imagina a PlayStation agradecendo ao sucesso da Insomniac Games por carregar a geração do PS5 nas costas até o momento.


Outra opinião minha é que a PlayStation faz um péssimo trabalho em vender/divulgar suas IPs. O investimento é muito massivo nas semanas que antecedem o lançamento, porém dias ou semanas depois você já não vê conteúdo sobre o jogo sendo veiculado. Além disso, falta aproveitar melhor a força de produção de seus estúdios com projetos de menor escopo e que podem entregar fluxo de caixa e aumentar a cadência de lançamentos e engajamento com os estúdios e com a marca principal. Isso sem falar de como vendem/divulgam mal algumas de suas IPs. É inacreditável que Ratchet & Clank e Returnal, por exemplo, tenham performado aproximadamente com os números que conhecemos, mas esse é um assunto que eu quero tratar em outro texto.


E com esse resumo dos últimos anos, chegamos ao momento em que, após ser reprovado em uma espécie de consultoria realizada pela Bungie, o projeto internamente chamado de The Last of Us Online, foi cancelado pela Naughty Dog. Em uma publicação, a empresa anunciou que o escopo do projeto, que já estava sendo desenvolvido há aproximadamente quatro anos, se tornou algo muito maior do que o imaginado. Isso levou o estúdio a ter que tomar uma decisão: se tornar refém daquele projeto, movendo toda sua força de trabalho para alimentar ele com conteúdo ou optar por cancelá-lo, lidando com um prejuízo enorme, e focando em entregar as experiências single-player que fizeram da Naughty Dog um dos melhores estúdios da indústria e um parâmetro quando o assunto é qualidade técnica.


É óbvio que um cancelamento não é algo positivo. Muito tempo foi perdido. Milhões de dólares foram jogados no lixo e, mesmo que a empresa aproveite tecnologias desenvolvidas ali, o impacto ainda é muito grande. Mas é preciso considerar que o outro caminho que o estúdio poderia ter tomado seria algo muito, mas muito pior. Ver um dos melhores estúdios da indústria migrando para um novo modelo de negócio que visa somente o lucro, não me deixa pensar em um destino pior. E se você acha que todo jogo visa exclusivamente lucro, a gente precisa ter uma conversa à parte.


Bom, no comunicado, a empresa confirmou que está trabalhando em mais de um projeto single-player e que mal pode esperar para mostrar mais deles quando estiverem prontos. E se você ainda quer saber o que eu penso disso, eu achei maravilhoso. É como se a parte da comunidade que eu me incluo tivesse tido o maior passo, até o momento, em direção a um futuro mais interessante. O recente anúncio da aposentadoria de Jim Ryan completa o "pacote esperança" de que algo pode mudar. De que essa estratégia possa ser repensada, se é que já não está sendo, como deveria ter sido feito desde o início, e que jogos single-player voltem a ter a importância que já tiveram em um passado próximo, mesmo que isso já tenha custado uma boa parte da geração para a PlayStation, coisa que muita gente não percebeu. Afinal, quando uma marca se afasta do seu consumidor como a PlayStation vem fazendo, o destino é um só e ele não é legal para nenhuma das partes.


Obrigado por ler e não deixe de comentar a sua opinião para podermos trocar ideia sobre algo tão legal e importante para nós.

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