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Metaphor: ReFantazio - Análise



A fantasia nos acompanha desde crianças e histórias são parte das nossas vidas. Sonhamos com mundos diferentes, lugares utópicos - qualquer coisa que sirva de escapismo da realidade na qual vivemos. Nossa ânsia por um lugar que nos dê esperança coloca em questionamento a nossa própria realidade.


Frequentemente subestimamos o poder da arte em nossas vidas. Quais são os limites do poder da fantasia? Seria ela capaz de mudar o nosso mundo? Metaphor: ReFantazio traz esses pontos à frente de sua história: um exercício de questionamento da força dos sonhos e fantasias perante a ansiedade que nos assola e como podemos usar sua influência perante os desafios que nos são impostos. Talvez uma obra de fantasia não seja o suficiente para mudar o mundo, mas ela pode mudar uma pessoa, e pessoas mudam o mundo.


Recriando a fantasia


Estamos vivendo uma renascença nos RPGs japoneses, popularmente chamados de JRPGs. Depois de um período conturbado na geração do PS3 e Xbox 360, o gênero voltou a ganhar força na geração passada. Um dos principais responsáveis por essa reviravolta foi Persona 5, que conseguiu quebrar as expectativas e colocar finalmente a franquia em evidência aos olhos do grande público.


Persona 5 foi muito importante para mim. Usando o tema levantado no parágrafo inicial, o jogo mudou minha vida, me fez criar interesse por um gênero que antes não me chamava muita atenção e me fez criar amizades que levo comigo até hoje. A minha vida seria bem diferente sem esse jogo. E é irônico que o próximo trabalho das mesmas mentes criativas por trás da franquia Persona use de alicerce justamente a influência da arte na vida das pessoas - e como isso me faz refletir sobre a importância da arte na minha própria vida. 


O diretor Katsura Hashino e sua equipe - após anos trabalhando na franquia Persona - resolveram se aventurar no gênero de fantasia, mas com uma proposta original, e assim nasceu Metaphor: ReFantazio, um jogo que pega elementos tanto de Persona quanto de Shin Megami Tensei para criar algo novo que talvez possa atingir o mesmo nível de reconhecimento dos irmãos mais velhos.


Metaphor não é sua fantasia convencional, por mais que vários elementos recorrentes marquem presença aqui, como cavaleiros, dragões e masmorras. Mas desde a sua concepção há algo inusitado: e se nesse mundo a fantasia fosse a nossa realidade? Sim, essa mesma do nosso “mundo real”. Um mundo utópico que descreve nações em paz, uma realidade sem conflitos ou segregação. 



É um conceito fascinante. Somos a utopia de um mundo de fantasia, mas a nossa realidade está longe de ser como eles imaginam, e talvez essa contradição seja a verdade de todas as fantasias utópicas que criamos quando paramos para pensar. A intenção de criar um mundo de paz e sem conflitos é nobre, mas seria ela possível? E mesmo que seja, é realmente essa a intenção?


Não vejo a criação de uma sociedade utópica como a grande intenção nessas obras, pelo contrário, a ideia é nos ajudar a enfrentar as dificuldades em nossas próprias vidas e a sermos pessoas melhores, além de nos inspirar em momentos difíceis ou acalmar nossas almas escapando para uma realidade mais gentil onde podemos parar para pensar sem as aflições que nos sufocam. 


É isso que Metaphor tenta entregar em sua narrativa. Como um livro de fantasia, onde não existe preconceito, as pessoas são felizes e as adversidades podem ser enfrentadas e vencidas, tudo pode influenciar em sua jornada para se tornar rei e mudar o mundo para melhor, porque por mais que a utopia seja só uma ideia, a melhoria do agora é possível e necessária.


Metaphor se passa no Reino Unido de Euchonia, uma terra com três nações que foram anexadas após uma grande guerra. O jogo abre com assassinato do rei pelas mãos de um comandante prodígio chamado Louis — o grande antagonista do game claramente inspirado no Grifith de Berserk. Logo somos introduzidos ao protagonista, que é acompanhado de uma fada chamada Gallica. Eles têm como missão passar uma mensagem a um homem infiltrado no exército real e ajudá-lo a curar o príncipe, que está à beira da morte após entrar em coma por causa de uma maldição, resultado de uma tentativa frustrada de homicídio.


Louis também é culpado pelo ataque e o único jeito de curar a maldição é matando-o. No trajeto, encontramos Strohl, um jovem nobre que se alista no exército para tentar fazer justiça. Brevemente ele cria uma relação com o protagonista e vira seu primeiro amigo nessa aventura. Após tanto transtorno, no funeral do rei, uma magia especial é liberada: o rei deixou preparada uma prova de sucessão ao trono, cuja data limite é até o “dia do herói”. Quem tiver mais apoiadores até lá será o novo rei. Eis o pontapé inicial para a jornada começar com uma premissa que, por si só, já foge dos padrões do gênero.



A história talvez seja o ponto mais forte da experiência. O desenrolar das coisas acontece de forma natural e intrigante até o fim. Todos os personagens têm motivações claras e agem de forma coerente e o enredo nunca deixa de surpreender, sempre reafirmando seus temas de um jeito satisfatório. 


Um elemento que eleva tudo é o grande antagonista do game, Louis, que é um homem frio, mas muito inteligente. Toda vez que ele está em tela, nossa atenção é fisgada, como se Louis tomasse os holofotes de cada cena para si, tal qual um monarca completo. Vilões podem cair no clichê muito fácil, sendo apenas um obstáculo na jornada que você esquece da existência na sua realidade. Aqui, Louis é quase um personagem principal de tanto que a trama gira em torno dele e é certamente um dos melhores aspectos da narrativa e um dos inimigos mais marcantes dos últimos anos.


Meta para o reino 


Uma das grandes inspirações para os temas de Persona é o psiquiatra Carl Jung, com as ideias de personas e sombras. Metaphor também é muito inspirado por suas pesquisas, e isso vem na forma dos arquétipos, os quais são uma forma de consciência coletiva que vem de gerações passadas - quase como uma memória conjunta que a humanidade possui - e serve para nos expressarmos perante o mundo. São padrões de comportamento que podem ser vistos durante a história da raça humana.



Em Metaphor, os arquétipos são utilizados como figuras de heróis despertados pelos protagonistas quando eles finalmente enfrentam seus medos. Essa parte psicológica é muito bem incorporada na jogabilidade e os arquétipos são uma adaptação do sistema de “jobs” comumente vistos em JRPGs. Aqui, tais “jobs” são uma das variações mais completas e maleáveis desse sistema e há mais de 40 combinações que podem ser trocadas entre os personagens do grupo, o que fica ainda mais interessante, já que é possível passar habilidades de um arquétipo para o outro através dos chamados “espaços de herança”.


A complexidade de builds fica quase infinita, mas isso não torna o jogo maçante - pelo contrário - as combinações são de fácil assimilação, o que torna a construção da sua estratégia dinâmica, contínua e prazerosa. O sentimento é que a todo momento você está evoluindo e se fortalecendo na aventura. Dependendo das escolhas que você investir, o resultado pode ser vantagens ou desvantagens dependendo dos encontros com inimigos. Por isso, é de suma importância se preparar bem antes de entrar em uma dungeon ou batalha longa.


Algo que ajuda nesse sentido é o sistema de informantes: nas tavernas, há uma pessoa que vende informações para suas futuras missões, contando mais sobre os inimigos daquele local. Eles não vão determinar o seu sucesso, mas como o jogo pode ser punitivo caso você não se adapte bem às suas mecânicas, toda ajuda é bem-vinda.



Outro tema recorrente no jogo é a ansiedade, um tópico novamente incorporado na história e nas interações secundárias. É um aspecto muito importante, representado como uma condição negativa que você e seus aliados podem sofrer durante as batalhas, impedindo suas ações. Certamente gerará momentos de tensão no combate, mas a forma como está presente na trama principal é onde o conceito mais brilha.


No decorrer da história, a ansiedade das pessoas vai se tornando algo mais palpável e gerando grandes consequências. As pessoas depositam sua fé por meio de desespero aos tiranos - como uma forma de se livrar da responsabilidade escolhendo líderes que aparentam ser mais aptos para governar - e até coisas ainda maiores que vão sendo reveladas conforme a narrativa avança.



Política e religião não são estranhas quando o assunto é narrativa em videogames. Na verdade, podem ser utilizadas até demais, principalmente quando a obra não tem nada a dizer. Críticas vazias são o que mais tem e às vezes são muletas narrativas para tentar criar uma sensação de importância e profundidade ou apenas uma boa mensagem em uma carta difícil de compreender, mas Metaphor felizmente usa esses dois tópicos de uma forma brilhante. 


Poucas vezes vi um jogo usar os temas de forma tão prolífera, permeando todos os momentos da experiência sem parecer forçado. Ele sabe muito bem como abordar suas reflexões com nuance, sem ficar preso no preto ou branco e indo além, trazendo as ideias para o cerne da história. Os personagens estão inseridos em uma sociedade dominada por uma religião autoritária, onde não existe separação entre ela e o Estado e tudo que desvia dos ensinamentos é considerado blasfêmia. Outras doutrinas religiosas são consideradas pagãs, com seus praticantes sendo perseguidos e excluídos. 


O protagonista é da tribo Elda, uma raça considerada amaldiçoada, então não só vemos outras pessoas sofrendo com a opressão, como você mesmo é alvo dessas injustiças, trazendo toda a discussão mais próxima ao jogador, fazendo-o sentir na pele - pelo menos um pouquinho - da dor que é estar entre os oprimidos. 


Com o tempo, mudanças vão acontecendo no comportamento das pessoas. Os NPCs espalhados pelas cidades comentam os acontecimentos da história, expõem suas opiniões e medos e essa é uma das partes da experiência que mais me cativaram. É difícil diálogos tão secundários se destacarem em jogos do gênero, mas aqui eu perdi horas e horas apenas conversando com todos que eu encontrava, porque fazia sentido conversar, e isso foi algo fundamental na construção do mundo, ironicamente tornando a fantasia mais parecida com a nossa realidade. Um choque entre utopias que, certamente, acrescentou ao nosso mundo e ao mundo do meu protagonista.


Outro aspecto ainda mais interessante é a sucessão do Poder, por ser algo novo para a população. Estamos vendo pela primeira vez o povo descobrindo que tem voz, que tem força. Isso cria momentos muito interessantes de personagens em conflito sobre seus ideais e aprendendo a expressar seus anseios. O que também cria espaço para pessoas que só querem tirar vantagem, com todo o tipo de proposta bizarra (novamente, uma fantasia que não está tão longe da nossa realidade).


Toda essa disputa política tem bem mais camadas do que faz parecer. A superfície é simples e não traz reflexões diferentes do que estamos acostumados, mas quanto mais o jogo avança e as ideias começam a se misturar, temos uma visão bem mais minuciosa de tudo. Metaphor não é sobre uma revolução, muito menos é uma história clichê de bem e mal, certo e errado, religião é ruim, o governo é ruim e acabou.


É muito mais do que isso. A história discute problemas sistêmicos como racismo e igualdade - obviamente tomando um lado nesses aspectos - mas não aponta apenas um culpado. A idealização fica para a utopia, a realidade não é tão simples e os personagens nunca clamam saber de tudo, eles fazem o que acham certo, e tentam o melhor que conseguem. Isso tudo traz ao jogo uma visão muito mais interessante do que simplesmente dizer que tudo ficará bem ou que não há esperança alguma com um pessimismo crônico.


No fim, é uma história muito mais sobre pessoas com suas próprias visões querendo construir um mundo melhor do que sobre ideologias, e nesse sentido conseguem trabalhar tudo muito bem.



Uma jornada não seria nada sem aliados marcantes, e o grupo formado aqui talvez seja um dos melhores do gênero. Cada personagem vem de uma tribo e tem seus trejeitos e perspectivas, todos com designs inspirados, eu diria que é o ápice da arte do Soejima.Metaphor usa um sistema parecido de elos sociais da franquia Persona, mas aqui é mais direto e objetivo.


Todos os elos sociais presentes no jogo são no mínimo bons, algo que eu não posso dizer de nenhum título passado da empresa. Todos são bem escritos e interessantes e se entrelaçam com os temas do jogo com perfeição. Um exemplo é Brigita, uma comerciante de ignitores (forma como a magia é usada nesse mundo). Ela é bem fechada e ríspida no começo, mas começa a mostrar seu lado mais gentil conforme vocês se conhecem e ela passa a te contar mais sobre sua vida, o que faz você pegar afeição a ela ao longo da aventura. Isso acontece com todos os personagens secundários.


A qualidade deles e suas histórias variam, mas nenhum é desinteressante ou ruim. Todos aqui têm algo relacionado aos temas do jogo de uma forma mais profunda. A variedade de raças e situações que podem ser inseridas nesse mundo ajuda a construção dessa gama mais ampla de situações. O jogo não tem medo de ir para lugares sombrios, várias das situações são de partir o coração, mas não é nada gratuito e a narrativa ganha mais camadas por isso. Quando os momentos mais leves aparecem, o contraste os deixa mais especiais. È um momento de paz que, de fato, traz calma e descontração tão necessárias em meio às angústias e sofrimentos.


Os personagens do seu grupo são os exemplos mais claros dessa qualidade de escrita e afeição. Todos têm um passado interessante e ambições para o futuro. Alguns dos melhores momentos do jogo estão nos diálogos com eles, seja pelo sentimento de impotência da Hulkenberg ou o peso da responsabilidade que o Strohl carrega. 


A química do grupo é forte desde o começo. Os personagens sempre agem como pessoas com um objetivo em comum. Todos estão em uma jornada de suma importância, então não há muito espaço para momentos leves e sessões mais cômicas, mas os que estão ali são muito bem colocados e engraçados. Isso permanece por todo o jogo, cada personagem que aparece traz algo novo para o grupo, todos conversam entre si, fazem observações que muitas vezes outros jogos deixam passar.


Reflexões que você como jogador acaba tendo e logo um personagem também questiona dentro do jogo. O acúmulo desses momentos cria essa sensação de companheirismo que muitas obras tentam alcançar, mas poucas conseguem. Todo mundo ali vai ficar comigo por muito tempo e a equipe é um dos pontos mais altos da experiência e talvez seja o grupo mais bem escrito que a Atlus já fez.



Um medo recorrente quando um time celebrado por uma franquia ou gênero específico cria algo novo é fazer com que o game tenha uma identidade própria. Isso era um receio que eu tinha com Metaphor. Principalmente por ser outro JRPG, ele poderia simplesmente ser um mero “Persona de fantasia”, mas felizmente esse não é o caso. Pelo contrário, posso dizer que essa afirmação é tão superficial que se torna um erro.


É inegável que Metaphor pegou muitos elementos já vistos nos títulos da Atlus, principalmente de Persona 5, porém se inspirou bastante em Shin Megami Tensei e outros jogos clássicos do gênero, porém sempre se distanciando o suficiente para ser algo novo e diferente. Você sabe de onde veio cada inspiração de Metaphor, o que só deixa mais óbvio o quão original e diferenciado ele é.


Espadas, calabouços e dragões


O combate de Metaphor é outro grande diferencial. O que mais faz seu sistema de combate se destacar é ter uma divisão entre sistema de luta em tempo real que rola antes de entrarmos no tradicional combate por  turnos dos outros títulos da Atlus. Esse combate de turnos ainda é o foco do jogo e é onde as maiores batalhas vão acontecer.


O sistema em tempo real funciona de uma forma que te dá vantagem se você conseguir acabar com a barra de postura do inimigo, fazendo você entrar no combate por turnos já tendo causado dano nos inimigos e os deixando atordoados. A maior vantagem desse sistema é quando seu personagem está num nível muito acima dos inimigos. Nesse caso, ao atacar você derrota os inimigos sem precisar entrar no combate tático.


Isso serve para acelerar a exploração e ainda ganhar experiência e itens sem precisar passar por um processo tedioso de esperar por diversas animações para derrotar inimigos fracos, e também não deixa algo automático: você permanece com a agência do personagem, além de terem feito um bom trabalho no feedback dos golpes, sendo divertido acabar com hordas de inimigos de forma rápida e dinâmica. E falando em dinamismo, o combate por turnos segue a tradição dos últimos jogos da Atlus de ser rápido, visualmente interessante e engajante, aqui usando como base o modelo “press turn” de Shin Megami Tensei, mas com algumas adições. 



Começando pelo básico, o combate funciona com base na sua quantidade de ações, ilustrado por um cristal na parte superior da tela. Cada personagem tem um cristal de ação por turno, porém a ação não é gasta ao acertar a fraqueza do inimigo, o que faz outra ação ficar disponível depois que os personagens quatro forem utilizados. Esse é o elemento mais importante do combate, pois tudo gira em torno disso e é necessário pensar bem nas suas ações porque elas determinam quantas vezes você vai bater - ou apanhar. 


Durante o combate, você pode usar as ações para atacar com magia - consumindo pontos de magia - ou sua arma branca, usar itens, se defender, passar o ponto de ação para outro personagem, substituir alguém da party ou usar uma habilidade bem mais poderosa chamada de síntese. Esta funciona como uma sinergia entre dois personagens Ao utilizar, duas ações serão gastas, além dos pontos de magia dos dois personagens, mas são técnicas que podem mudar o rumo dos confrontos. Seu custo é alto, aumentando a complexidade da estratégia ao exigir do jogador um bom conhecimento de todas as suas forças, criando uma satisfatória dinâmica de risco/recompensa.


Isso que nem citei a mecânica das duas fileiras. Você pode alterar o personagem entre a fileira da frente e a de trás durante seu turno, o que não gasta ponto de ação, mas influencia na sua defesa e ataque. Na linha de frente, você causa mais dano, porém também recebe mais devido a uma maior exposição aos inimigos, enquanto na retaguarda sua defesa sobe às custas do seu poder de ataque.


É bem importante usar essas variações, principalmente nas lutas contra os chefes. Apesar do sistema completo ser bem complexo, não se preocupem, é intuitivo desde o começo. É fácil de aprender enquanto ele se expande aos poucos, então o nível de dificuldade será apertado progressivamente, sendo bastante exigente apenas em lutas com grau de dificuldade mais elevado, as quais você já deve ter preparo para fazer com o que aprendeu durante a jornada.


A estrutura do jogo também é bem distinta, apesar de usar uma mecânica de calendário parecida com Persona, tem diferenças grandes graças a sua base móvel, o trotador. Um grande foco é colocado na viagem pelo reino, lugares distantes levam mais tempo para chegar, então o jogo pede para fazer decisões de onde ir considerando a distância. Usar seu tempo com sabedoria é essencial nos jogos da Atlus, e apesar de não ser tão restrito quanto em Persona, escolher uma rota que passa por alguns lugares que você precisa ir para completar uma missão pode economizar tempo. 


Durante a viagem aparecem mais os elementos sociais do jogo, há diversas atividades com recompensas variadas. Conversar com algum aliado pode subir uma das 5 proficiências, que são coragem, eloquência, imaginação, tolerância e sabedoria. Elas são importantes por haver missões que dependem de um nível específico dessas proficiências. Outras atividades incluem limpar os cômodos, ler livros, cozinhar (as comidas são itens consumíveis que podem ajudar muito nas batalhas) e subir o seu nível de confiança com seus amigos.


As atividades variam por dia, algumas só podem ser feitas de dia ou de noite. Ocasionalmente, seu trotador pode ser atacado, forçando-o a derrotar os inimigos. É uma maneira inteligente de quebrar a rotina ou te tirar daquela sensação de segurança, afinal, você está navegando por um ambiente hostil e deve estar pronto para os desafios da própria viagem. 



O conteúdo secundário varia entre as atividades que citei no trotador e missões secundárias. Sua qualidade varia: há missões que são muito bem escritas (geralmente essas estão atreladas aos ranks sociais dos aliados), já outras são mais simples e genéricas, que envolvem pegar algo em alguma cidade ou dungeon. As dungeons são grande parte do conteúdo secundário, e todas são feitas à mão, com um level design já pré-estabelecido, fugindo das partes criadas de forma procedural nos jogos da série Persona.


Apesar de ser uma evolução, o jogo poderia se beneficiar de mais variedade nesses layouts, uma vez que algumas podem ficar repetitivas, mas nada que incomode de verdade. Tudo em volta é tão bom que você não sente que está fazendo algo inútil ou perdendo tempo. As dungeons não são muito longas, o que ajuda também, e sempre tem um boss te esperando para deixar as coisas mais interessantes.


O poder da arte


Os RPGs da Atlus sempre tentaram fugir do gênero de fantasia, criando uma identidade própria com temáticas contemporâneas, isso com certeza é um charme dos jogos deles e foi essencial para as franquias se destacarem. Quando o time resolveu criar um jogo de fantasia, um dos focos era dar a cara deles ao gênero, não apenas pegar uma identidade já existente e simplesmente copiar. Os artistas tiveram que encontrar essa visão. Em entrevistas com o Soejima (artista principal da franquia Persona), ele fala da dificuldade que foi conseguir mesclar seu estilo com um mundo fantástico, principalmente no começo quando ele sentiu que estava apenas copiando o que os outros já fizeram. 


Hoje nós vemos que, apesar da dificuldade, ele teve sucesso na criação de uma fantasia original. A parte visual de Metaphor talvez seja o que mais chama a atenção logo de cara, uma mistura de arquiteturas distintas, moda e cores, tudo em uníssono, criando algo único. Os menus com suas artes que parecem pintadas à mão, as pinceladas de tinta são predominantes na arte presente em todo o jogo.


As cores são vibrantes e causam um impacto logo de cara. Após anos utilizando o mesmo catálogo de demônios/personas, ver um jogo da Atlus com uma galeria nova de criaturas é fascinante, tantas ideias interessantes e novas interpretações em criaturas recorrentes nas obras de fantasia. Sem falar nas criaturas mais temidas no reino, os “Humanos”, seres com designs perturbadores, que têm como característica principal partes do nosso corpo distorcidas em uma amálgama de carne. Algumas parecem seres saídos direto das pinturas do Salvador Dali. O mundo do game se destaca muito, é uma união de vários aspectos, mas se a arte não tivesse uma identidade forte, tudo poderia ruir. Felizmente, acertaram com louvores.



Outra forma da reverência à arte no jogo é quanto à música. A música que ouvimos no jogo é uma magia da sua aliada fada Gallica, ela diz que a música foi a primeira magia do mundo e tem o poder de auxiliar as pessoas. O som te acompanha durante todo o jogo e certamente ajuda na experiência, novamente o jogo usando uma metáfora para reforçar seus temas. A trilha sonora em si é maravilhosa, mesmo que abaixo do que esperamos do Shoiji Meguro comparado aos seus trabalhos com a franquia Persona.


Aqui, por ser um estilo diferente do que ele está acostumado, não há tanto espaço para variedade. E às vezes sinto que faltaram músicas para alguns momentos se destacarem mais: várias lutas contra chefes usam o mesmo tema e com o tempo isso acaba cansando. Ainda é uma trilha poderosa, que usa cânticos religiosos que causam uma estranheza de outro mundo e - ao mesmo tempo - são estranhamente interessantes. Nas músicas mais emocionais, eles acertam o tom e elevam as cenas. No geral, é um trabalho excelente, mas talvez um dos pontos mais baixos do jogo, o que só reforça como tudo está em um nível altíssimo de qualidade.



Conclusão 


São jogos como Metaphor que me fazem lembrar o porquê de eu amar videogames. Não é apenas uma forma de passar o tempo, mas sim uma ferramenta poderosa de imersão e expressão, capaz de fazer a ficção se tornar algo real na sua vida. Toda obra de arte tem o poder de evocar sentimentos, mas sinto uma conexão especial com essa mídia, e usá-la de uma forma tão interessante, levantando a questão sobre a importância da fantasia nas nossas vidas, me fez não só repensar todas as vezes que uma obra me impactou, mas acima disso, mesmo que piegas, me fez olhar para muitas coisas com outra perspectiva e até mesmo com mais otimismo. 


Não é raro eu me conectar a uma obra, mas posso contar nos dedos quantas vezes uma história me fez refletir tanto sobre a maneira como consumo arte e como as obras afetam a minha vida. No fim, essa é uma experiência que me faz querer ser uma pessoa melhor. Reforça a minha noção de não olhar para a arte como uma mera forma de escapismo,  mas como uma maneira de enriquecer a minha vida.


Histórias fictícias não têm menos valor por não serem “reais”. Só o fato de nos impactarem e permearem nossas mentes já as traz para a realidade. A ficção, muitas vezes, é uma versão idealizada dos nossos sonhos, e mesmo que os sonhos possam ser inalcançáveis, o simples fato de existirem já muda o trajeto das nossas vidas. A esperança de viver sua fantasia é a luz que nos guia perante o desespero. 


Metaphor: ReFantazio consegue te convencer disso, dessas palavras de esperança, mas não de uma forma ingênua que acredita que algo possa melhorar do dia para a noite ou que momentos sombrios nunca mais irão surgir, mas sim em sermos melhores. O jogo faz isso unindo todos os seus temas, entregando-os de uma forma concisa, mesclando jogabilidade, sistemas e narrativas como poucos jogos fazem.


Cada personagem aqui tem algo a dizer e cada um me marcou de algum jeito diferente. Há tantos momentos pequenos e grandes, frases que me fizeram pausar o jogo e pensar em tudo o acontece nesse mundo fictício e no nosso próprio, o que só prova a qualidade da escrita presente aqui. Mesmo que em alguns momentos possa parecer piegas ou super expositivo, a narrativa nunca deixou de me impressionar.


A arte também é inesquecível e consegue passar uma identidade tão única e poderosa que, mesmo com o jogo cheio de problemas técnicos, torna Metaphor um dos jogos mais impressionantes visualmente que já joguei. E é impossível falar disso sem lembrar dos menus, que mostram mais uma vez que a Atlus está no topo da indústria nesse quesito.


Metaphor é o motivo de eu amar videogames, é o motivo de eu amar histórias e, principalmente, é o motivo de eu amar fantasia. Hashino e sua trupe continuam sendo os grandes reis dos JRPGs modernos, em uma perfeita metáfora dos personagens de sua mais nova obra-prima.





A análise foi escrita por @Ceythian


Ela só foi possível graças à parceria com a Nuuvem

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