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Alan Wake II - Análise


Metalinguagem é uma figura de linguagem. Trata-se de uma obra que fala de si própria. Não tem palavra melhor que esta para definir Alan Wake II. Em 2010, Alan Wake surgiu como um jogo de terror focado em investigação e com elementos de ação, mas seu principal charme - e o que criou uma seita de fãs mundo afora - foi a sua história. Esta seita cultuava a frase “It is not a lake, it is an ocean” (Isso não é um lago, é um oceano) e sonhava com um mundo onde a prometida sequência para o capítulo “Departure” de Alan Wake nasceria. 


Desde então, a Remedy - desenvolvedora do jogo - lançou Quantum Break em 2016, Control em 2019 e, no ano passado (2023), finalmente trouxe a luz para o escritor com o lançamento de Alan Wake II em outubro. A seita finalmente teria mais palavras para cultuar e espalhar seu poder para o mundo. O jogo foi extremamente bem recebido pela crítica e pelo público, ganhou diversos prêmios de jogo do ano em revistas e sites relevantes. Teve até direito de fazer uma apresentação musical especial no evento do The Game Awards, marcando sua presença como um piscar de luz que se destaca na escuridão profunda. Mas, será que tudo isso não é uma ilusão difundida pela seita após 13 anos cultuando a palavra de seu ídolo? Alan Wake II realmente é uma luz em meio ao sombrio mundo de jogos sem alma? A investigação desse texto irá descobrir.



Um novo começo


Alan Wake II já começa essencialmente igual ao primeiro jogo. Somos largados no meio do nada, com o controle de um desconhecido e seguimos por um ambiente hostil e bem escuro. A princípio, parece a mesma coisa, mas rapidamente o jogo já mostra que a sua introdução é só o começo de algo além da nossa compreensão. Essa mudança na condução da história - criando um mistério sinistro - instiga mais a curiosidade do que os acontecimentos do tutorial do primeiro jogo, e Alan Wake II te recompensa se você gosta de ir atrás de respostas para as suas perguntas, já que explorar e entender seja lá o que aconteceu ali é exatamente o que ele vai te pedir para fazer. Adiante, somos introduzidos às principais personagens e mecânicas novas, além do contato com várias referências e personagens do primeiro jogo que certamente toda a seita vibrou quando os viu.



Gameplay de Resident Evil?


Se alguém te disse que a gameplay de Alan Wake II é igual a de Resident Evil, preciso dizer que não é bem assim. É nítido que o jogo tem alguma influência dos títulos mais recentes da Capcom. Porém, Alan Wake II tem sua própria filosofia de combate e exploração que o distingue muito de jogos como Resident Evil 2 Remake. Observe que Alan Wake II é um jogo de terror e sobrevivência com mais foco no terror que na sobrevivência, diferente de Resident Evil, onde a sobrevivência é tão fundamental quanto o terror. Então, se Alan Wake te deu uma arma, não é para você guardar para o momento mais urgente como acontece em Resident Evil, aqui você deve focar em usar tudo o que você tem da forma como for melhor para você progredir na história. 


É sempre bom lembrar que não é só um posicionamento de câmera e uma temática que definem o combate de um jogo, toda sua filosofia também é importante. Como exemplos, você pode olhar para as franquias Uncharted e The Last Of Us, para a primeira trilogia de God of War e a primeira trilogia de Devil May Cry. Todos estes jogos também têm semelhanças, mas execuções profundamente distintas. Portanto, não veja Alan Wake II como uma “cópia” de jogos recentes de Resident Evil, pois ele não é.



A jogabilidade de Alan Wake II


O jogo tem dois protagonistas: a policial Saga Anderson e o escritor Alan Wake. Os dois têm a mesma jogabilidade, em resumo bem simples, é explorar o cenário e usar a lanterna para deixar os inimigos vulneráveis aos seus tiros, mas eles contam com vários recursos exclusivos. Há armas, mecânicas e cenários únicos que só um personagem terá acesso e, para ver e entender a história completa, você terá que jogar com os dois, você não tem escolha. Brincadeira, você tem uma escolha sim: a partir de um certo ponto, você poderá escolher com quem você quer jogar até acabar a história desse personagem, podendo alternar a hora que quiser para o outro quando estiver no local certo.


Então, se você gosta mais do Alan ou se você tiver mais curiosidade pela história da Saga - como foi o meu caso - pode seguir com eles até o final sem preocupação. Só fique ciente que, a partir de um certo ponto nas histórias, você será obrigado a trocar de personagem e concluir a outra campanha. Na história da Saga, há um aviso bem explícito sobre este momento, na história do Alan, é mais sublime e pode passar despercebido, então preste atenção no contexto da história caso você queira continuar explorando o jogo antes de avançar.



Lugar mental / Mind Place


Esta mecânica é tão incrível para mim que decidi dedicar uma sessão inteira só para ela. Nela, você entra na mente do seu personagem, em uma sala, onde estão seus coletáveis, upgrades e recursos de gameplay. 


No caso de Saga, é aqui que você aprofunda a investigação do mistério, tendo como principais ferramentas um quadro de detetive para analisar as evidências e provas coletadas e uma parcela da sua mesa dedicada para ter contato com a mente dos envolvidos no caso, incluindo os pensamentos mais profundos e escondidos de cada um deles. 

No caso de Alan, é aqui que você pode mudar a realidade - e isso não é uma expressão exagerada, é literal: você tem uma lousa totalmente delicada para a imaginação do autor, onde ele pode ter inspirações e reimaginar as cenas onde está presente, moldando o ambiente e desenvolvendo a história para abrir novos caminhos, encontrar segredos e mergulhar nos profundos mistérios do Dark Place.


Inclusive, um detalhe que vale a pena destacar é como o Mind Place reflete o que tem na cabeça de cada protagonista. Ele é muito mais vazio, hostil e escuro para Alan, refletindo como está seu psicológico e o que importa para ele. Saga tem decorações, detalhes de sua vida pessoal, profissional, é muito mais recheado e iluminado. O jogo te comunica a personalidade das personagens sem mencionar uma palavra, apenas te inserindo no mundinho deles e com um recurso de gameplay único e inovador.


Uma coisa importante sobre essa mecânica é que ela não é um botão de pause. O ambiente onde você estava continua funcionando normalmente enquanto você está no Mind Place. É como se você fechasse os olhos e parasse para refletir no mundo real, todas as coisas ao seu redor continuam acontecendo de forma independente e isso é fantástico. Também é um dos motivos do jogo ser exclusivo para a atual geração de consoles e PC, infelizmente seria inviável processar tudo isso com o hardware disponível no Xbox One e Playstation 4.



A história é boa?


Sem spoilers, não posso falar muito. Posso relatar que todos os momentos que joguei o Alan Wake II foram imersivos e instigaram a minha curiosidade. As personagens me cativaram, principalmente Saga Anderson, seu parceiro policial e uma dupla de personagens secundários do primeiro jogo que aqui deram um show! O jogo conta sua história tanto de forma direta como por documentos, os famosos manuscritos do primeiro jogo, e objetos no cenário. Se você tem alguma dificuldade para ler textos mais longos, inclusive, o jogo possibilita que você escute o Alan narrando cada manuscrito lá no Mind Place. 


Só tem uma coisa que eu preciso te avisar aqui: se você não sabe inglês ou outro idioma que o jogo tenha dublagem, infelizmente, as legendas em português vão te fazer perder algumas nuances e detalhes. Não é uma legenda ruim, que fique claro, mas eu percebi alguns sentidos que são alterados de forma pequena que foram entregues para mim pela dublagem, e em um jogo como Alan Wake, cada vírgula faz toda a diferença. Alguém que não tenha uma bagagem de inglês, pode perder o que eu tive a oportunidade de perceber. Mas fique tranquilo, o principal da história está lá e você não precisa entender nada de inglês para curtir o enredo.



Sobre a platina / 100%


Como platinadora, acho necessário abordar um parágrafo curto sobre os troféus. A lista do Alan Wake II é bem generosa e agradável: troféus de história, troféus de combate simples, troféus de coletáveis e alguns troféus de coisas aleatórias dentro do jogo, todas simples também. Só recomendo que, caso você se importe muito, olhe um guia de coletáveis para jogar a história do Alan e para os comerciais de TV da história da Saga, já que esses são os únicos completamente troféus perdíveis que podem te exigir uma nova jogada do zero. Recomendo que faça um save manual antes do ponto de não-retorno da Saga por segurança.


Destaco que, no momento dessa análise, não há confirmação de troféus para às DLCs já confirmadas do jogo. Portanto, não é possível discutir sobre eles aqui. Entretanto, espera-se que sigam a linha da platina do jogo base, a qual é bastante acessível e recomendada.



Recomendações e considerações 


Nesta seção estão algumas sugestões minhas para você que quer jogar. Se você não tem interesse, pode ir direto para a conclusão. O foco desta seção é opinar como eu acho que a experiência é melhor e destacar algumas questões técnicas. Em primeiro lugar, recomendo fortemente um fone de ouvido, faz toda a diferença para entender melhor o ambiente ao seu redor, fica bem mais interessante, mesmo com um fone simples. 


Também recomendo que você escolha entre ficar alternando as histórias de Alan e Saga ou que jogue diretamente uma história por vez. Se você for alternar, acho que o jogo fica melhor caso mude de personagem após uma quantidade expressiva de capítulos, visto que eles têm durações e assuntos principais diferentes. Mas não se sinta preso, se você está seguindo de uma forma que a história flui para você, faça exatamente desse jeito, porque foi para isso que essa mecânica de troca foi implementada, para que você explore e desvende essa história como for melhor para você. 


Sobre a versão de PC, jogadores que não tem uma placa com suporte a tecnologia de mesh-shaders, introduzida nas RTX 2000 e Radeon 6000, eu sinto informar que a performance do jogo não será boa para vocês. É melhor não jogar, pois essa tecnologia é necessária para o jogo funcionar bem. Se você tem qualquer placa com suporte e dentro dos requisitos mínimos exigidos, pode jogar tranquilo o Alan Wake II. Porém, já aviso, o Ray Tracing no jogo é muito pesado. Só indico que ligue em placas entusiastas com potência de sobra, pois ele exige um hardware bem potente. Infelizmente, não pude aproveitar no meu computador, mas garanto que os reflexos tradicionais, com exceção dos espelhos que estão borrados, são competentes. 


Para resolução Full HD, na qual eu joguei, eu usei o upscalling no modo qualidade (renderizando em HD). Mesmo assim, senti uma falta de nitidez em alguns momentos. Recomendo que deixem o jogo o mais próximo da resolução nativa possível, principalmente em resoluções mais baixas. Sobre otimização, destaco que o jogo é bem otimizado, só é exigente em hardware mesmo. Acredito que uma boa otimização não seja só sobre abranger muitos perfis de hardwares, e sim sobre usar o hardware como um todo de forma eficiente. Placas como a antiga GTX 1080 Ti certamente teriam performance para esse jogo caso tivessem suporte a mesh-shaders. 


Para fins de transparência, joguei Alan Wake II em um PC equipado com um Ryzen 5 3600, RTX 3060, 32gb (2x16gb) de memória ram à 2666mhz. A resolução utilizada foi FULL HD (1920x1080) com o FSR 2.0 no modo qualidade. O preset gráfico utilizado foi o do “alto” com no máximo uma alteração ou outra em coisas pequenas nas configurações gráficas. Destaco que testei o mod do FSR 3.0 e não acho ele bacana no momento, pois os frames gerados por IA deixam um efeito de ghosting que quebra totalmente a imersão, além de não melhorar a latência, apenas aumentar a fluidez da imagem.



Conclusão


Alan Wake II é, de fato, um sol em meio às trevas profundas que são os jogos AAA hoje em dia. É um jogo único, criativo e que fala tanto de videogame quanto fala de cinema, de música e de tudo que Sam Lake, o diretor do jogo, quis que esse jogo fosse. É o maior lançamento da história da Remedy e todo elogio que esse jogo recebeu foi muito mais que merecido. Poderia escrever muito mais sobre ele, eu mal arranhei a superfície do conteúdo de Alan Wake II, e ainda assim, o tamanho e a profundidade desse texto já é maior do que o conteúdo completo de vários jogos que saem por aí. E isso não é um desmerecimento destes jogos, é um reconhecimento da grandeza de Alan Wake II. A seita estava certa: isso não é um lago, é um oceano. É profundo, denso, sombrio, desconhecido, e merece ser investigado por você.





Análise escrita por @Athena_Wofel

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