Análise feita por Gustavo (Ceythian) com cópia cedida pela Focus Entertainment
O intuito de uma sequência é iterar em cima do jogo anterior, expandindo o que funcionou e corrigindo o que não deu tão certo. Baseado nisso, A Plague Tale: Requiem, sequência direta de A Plague Tale: Innocence, é um grande acerto que corrige muitas coisas, expande outras e traz ótimas novidades que acrescentam bastante ao todo - ainda que não seja isento de problemas herdados de seu antecessor. Requiem consegue encontrar um melhor equilíbrio entre momentos de combate e exploração, criando uma experiência mais agradável, madura e intrigante do início ao fim.
Desenvolvido pela Asobo Studio e publicado pela Focus Home Interactive, A Plague Tale: Requiem acompanha os irmãos Amicia e Hugo seis meses após os acontecimentos do primeiro jogo. Aqui, eles se encontram em um momento de paz, buscando a ajuda da Ordem dos Alquimistas acompanhados de sua mãe Beatrice e de seu amigo Lucas, mas logo essa paz momentânea é quebrada novamente pela praga e os irmãos partem em uma jornada para encontrar uma ilha misteriosa que Hugo vê em seus sonhos.
É altamente recomendado jogar A Plague Tale: Innocence antes de partir para sua sequência, já que o jogo não faz esforço algum para te situar sobre acontecimentos passados e espera que você tenha jogado o original para ter um entendimento total da história, que aqui é mais madura, melhor desenvolvida e com personagens mais interessantes. A trama dessa vez é menos previsível e em muitos momentos corajosa. É cheia de momentos impactantes e emocionantes e, apesar de se alongar um pouco mais do que deveria, entrega uma experiência memorável.
Assim como em Innocence, o maior destaque da história é a relação entre os irmãos. Aqui vemos uma Amicia mais apegada e protetora do que nunca, e esse seu lado acaba virando quase que uma obsessão que a leva ao limite pelo bem do irmão. O jogo não deixa claro, mas Amicia parece sofrer de PTSD (Estresse pós-traumático), o que os leva a alguns momentos tensos e acrescenta ainda mais drama para a jornada cada vez mais exigente, tanto física quanto emocionalmente. É uma jornada grandiosa, cheia de novos personagens e paisagens distintas que faz a experiência parecer “fresca” mesmo após várias horas.
A escala do perigo que os personagens terão que enfrentar aumentou, mas sem perder o aspecto intimista que Innocence fez tão bem. Em Requiem, os ratos - maior ameaça do jogo - estão mais letais e inteligentes e isso cria situações mais desesperadoras, além de soldados estarem novamente lhes caçando devido a acontecimentos das horas iniciais do game. Com todos esses obstáculos, felizmente uma nova gama de habilidades e itens estão à disposição, dentre eles novos tipos de itens alquímicos que podem ser utilizados tanto na exploração quanto em um encontro com inimigos. Além do estilingue do primeiro jogo, Amicia agora tem uma besta que é mais letal, porém de munição limitada - uma ótima adição que dá mais versatilidade ao encarar os encontros, podendo ter uma postura mais agressiva ou passiva, postura essa que pode influenciar nas suas habilidades. O jogo usa um sistema semelhante a The Elder Scrolls V: Skyrim, onde você melhora atributos que usar, por exemplo: quanto mais silenciosa você for, um de três atributos irá aumentar te dando uma melhoria. Essas três são: prudência, agressividade e oportunismo. E as vantagens desbloqueadas são de grande ajuda.
O jogo ainda tem um sistema de melhoria para as suas armas e consumíveis, como aumentar a quantidade de bombas que você pode carregar e a velocidade de recarregar a besta. Essas melhorias podem ser conseguidas encontrando sucata pelos cenários, que serão utilizadas em bancadas encontradas no decorrer da jornada. Algumas dessas bancadas ficam trancadas, podendo ser acessadas descartando uma faca, algo bem parecido com The Last of Us. Eliminar inimigos também te faz perder a faca, que sendo bem limitadas criam um dilema interessante de onde usá-las. Uma das maiores adições ao jogo é que agora Hugo consegue controlar os ratos. Apesar de ser uma quantidade limitada, é muito útil para se livrar de soldados ou limpar o caminho os atraindo para uma isca. O combate do jogo, assim como no primeiro, continua sendo um dos seus pontos mais fracos, mas aqui está bem mais fluido e variado, mesmo que não salve algumas sessões onde a ausência de combate seria benéfica.
Um dos problemas do primeiro jogo era o excesso de encontros com inimigos, sem muitos momentos de descanso entre eles. Requiem melhora isso. Ele é estruturado de uma forma que não cansa muito com ações repetitivas, mas apesar disso, esse defeito não foi totalmente resolvido, sendo que algumas partes poderiam se favorecer de momentos mais calmos, sem tantos encontros com inimigos e isso faz com que a duração do jogo acabe sendo um pouco maior do que deveria, reforçando o problema.
A estrutura de Requiem é bem semelhante à do primeiro. Há momentos mais calmos de exploração e apreciação dos cenários que são usados para desenvolver o relacionamento dos personagens; sessões de combate que podem ser encaradas de forma furtiva ou agressiva usando as diversas novas habilidades e sessões de quebra-cabeça que geralmente envolvem chegar a algum lugar inacessível, seja pelo terreno ou por ratos no caminho. O melhor jeito de se lidar com as hordas de ratos ainda é com o fogo, já que eles não podem ir a lugares iluminados. Usar inimigos e carcaças de animais também serve como forma de distração. A maior parte do jogo é linear, o que permite criar uma experiência mais centrada e com cenários mais imersivos e criados à mão, mas existem momentos onde a área se abre bastante para explorar, algo semelhante aos jogos mais recentes da Naughty Dog - influência clara em muitos momentos do jogo. O level design também é bem competente, tentando sempre criar situações interessantes e distintas onde os desafios que, apesar de simples, são prazerosos de se resolver. Empurrar uma caixa para alcançar um local elevado, derrubar algo com seu estilingue ou acender algo com fogo afugentando os ratos são alguns exemplos.
Algo a se destacar é a trilha sonora, que é muito bem utilizada. Algumas faixas são especialmente tensas e contribuem para deixar esse mundo ainda mais volátil; em momentos mais emocionais, ela também entrega algo memorável e complementa a cena.
Talvez a parte mais atrativa de A Plague Tale: Requiem e seu maior trunfo seja o visual. Ele é facilmente um dos jogos mais bonitos dessa geração. Cada cenário é uma pintura, desde planícies verdejantes e densas florestas até ruas decrépitas da cidade sob a luz da lua. A atenção aos detalhes é notável e impressiona. Você pode passar incontáveis minutos apreciando cada canto e sempre ter a impressão de deixar algo passar. O sul da França é retratado de uma forma maravilhosa, passando uma sensação que poucos jogos conseguem. Gráficos não são tudo em um jogo, mas em casos como esse, aliados a uma maravilhosa direção de arte, criam um mundo crível e atmosférico realçando várias das outras qualidades dessa jornada.
Infelizmente toda essa beleza tem um preço, já que o jogo sofre de alguns problemas de performance. Não é algo que te tire da experiência, mas certamente é notável, especialmente em momentos com muita ação e coisas acontecendo ao mesmo tempo. Os bugs foram mínimos: algumas texturas demorando a carregar, animações não conectando direito e personagens teleportando, mas novamente nada que atrapalhe e devem ser corrigidos em breve com algum patch de atualização.
Veredito:
A Plague Tale: Requiem é impressionante em muitos aspectos. Um salto notável comparado ao primeiro jogo, com uma jornada inesquecível que exala alma e carinho. É uma experiência que, nesse escopo, se torna cada vez mais rara na indústria. Não é isento de problemas, já que tem um combate não tão interessante e que, pelo seu excesso, faz parecer que existe uma falta de confiança e coragem de entregar seções largas do jogo sem conflito, mas consegue compensar bem isso com todas as qualidades narrativas e visuais. É uma experiência que expande e aprimora o que o primeiro jogo fez. É certamente um dos melhores games de 2022.
A Plague Tale: Requiem está disponível para PS5, Xbox Series X/S e PC.
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